Davi
estava há dois dias em Ziclague, descansando da última batalha. Ao terceiro
dia, chega um homem ao arraial “com as
vestes rotas e terra sobre a cabeça”. Era um amalequita que havia
conseguido fugir do arraial de Israel, devastado pelos filisteus. O homem trazia
uma notícia: o rei Saul e seu filho, Jônatas, estavam mortos. Ele os havia
matado.
A
ironia da história fica por conta do desfecho. Ele aguardava ser recompensado
por Davi. Com a morte de Saul, inimigo de Davi, este, finalmente, poderia
reinar sobre Israel. “Davi vai ficar tão
feliz, que me presenteará com ouro, roupas finas e, quem sabe, um cargo no
palácio”, deve ter pensado o amalequita. Ao invés disso, Davi chamou um de
seus soldados e deu a seguinte ordem: “Vem,
lança-te sobre esse homem”. O soldado feriu o mensageiro, e este morreu.
Essa história pode ser lida nos seus detalhes no Segundo Livro de Samuel,
capítulo 1.
O
rei Davi não suportou a impertinência de um homem que havia acabado de matar o “Ungido
do Senhor” e que, ainda por cima, se vangloriava de tal fato. Quem conhece a
história sabe que o amalequita estava mentindo. Saul havia cometido suicídio. O
futuro rei de Israel – Davi – ficou tão furioso que ordenou a morte do
mentiroso. Foi então que Davi pronunciou as palavras que dão título a essa
mensagem: “A tua boca testificou contra
ti” (2 Sm. 1.16).
É
impossível ler essa história e não meditar nas inconsequências de nossas
palavras. Por razões diferentes das do amalequita, os homens têm falado coisas
que testificam contra si mesmos. São promessas não cumpridas, votos desfeitos,
compromissos ignorados, juras falsas, calúnias, mentiras, ofensas...
Não
faz muito tempo, um senhor de meia-idade teve de ouvir de um comerciante a
seguinte frase: “Você? Você se diz
crente? Mentira!”. A surpresa do comerciante se deveu ao não pagamento de
uma dívida e à tentativa, por parte do “crente” de adquirir mais uns produtos.
“Você se diz crente?”, como
deve ser constrangedor ouvir isso!
É
bom que se afirme que vida cristã não é vida perfeita. Não se está defendendo
aqui a absoluta necessidade de conduta perfeita a fim de evidenciar-se cristão.
Isso seria uma mistura de legalismo com farisaísmo e “impossivismo”.
Como
calvinistas, afirmamos as verdades bíblicas como às da Depravação Total e Pecaminosidade
Humana. Além, claro, da maravilhosa doutrina da Graça Irresistível de Deus
e da Santidade dos crentes. E como
calvinistas cremos tanto na Soberania de Deus quanto na Responsabilidade dos
Homens. Nossa santificação vem de Deus, mas isso não elimina nossa
responsabilidade de buscá-la e vivê-la na obediência aos preceitos cristãos.
O
apóstolo Paulo, como bom calvinista, equilibrava essas duas verdades com uma
naturalidade desconcertante para alguns: “Mas,
pela graça de Deus, sou o que sou; e
a sua graça, que me foi concedida, não se tornou vã; antes, trabalhei mais do que todos eles;
todavia, não eu, mas a graça de Deus comigo” (1 Co. 15.10).
Os
crentes de hoje se veem numa guerra. Estamos, sim, combatendo o bom combate.
Mas, quem são os nossos inimigos? Satanás,
o mais forte deles; o mundo, o mais
“tristemente prazeroso”; e, a carne
(a natureza humana), a quem somos mais vulneráveis. Se empenharmos todas as
nossas forças na luta contra um desses inimigos – Satanás, por exemplo –
ficamos expostos aos outros dois. Logo, precisamos, como ensinou Jesus, “vigiar e orar, para que não entreis em
tentação”.
Portanto,
tomemos cuidado a fim de não sermos derrotados por nós mesmos, pela nossa
própria boca. Falemos sempre a verdade, cumpramos sempre a nossa palavra,
sejamos leais e honestos, esforcemo-nos para sermos achados fiéis à Palavra que
professamos.
Talvez
se o amalequita tivesse vivido alguns anos mais tarde, nos dias de Salomão, e
tivesse ouvido e obedecido os conselhos do Sábio Rei, quem sabe, não teria tido
uma morte tão ingrata: “Não te precipites
com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante
de Deus [...]; Quando a Deus fizeres algum voto, não tardes em cumpri-lo;
porque não se agrada de tolos. Cumpre o voto que fazes. [...] Não consintas que
a tua boca te faça culpado, nem digas diante do mensageiro de Deus que foi
inadvertência...” (Ec. 5.1-6).
Rev. Renato Arbués.
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